Acabei
por pousar o livro de páginas generosas sobre o que havia de chamar de mesa de
apoio. Estava, há tempo demais, à espera de um dia. De uma pausa conveniente,
de um lugar perfeito. Agora tem um candeeiro aperaltado, de design arranjado, uma vela com a marca
estampada e um arranjo florar todo primaveril, por companhia. Penitencio-me –
menos do que seria necessário – por não devolver a atenção de outros tempos à
leitura. Atropelo-me, à margem de outros termos, na hora de fazer escolhas.
Surgem opções e razões. Entram numa luta inglória. Fico feito coisa nenhuma
perante o resultado. Não sei outro facto senão que sou eu o único e real culpado.
Não ofendi a decoração pensada, mas adulterei a função do livro. Noutro tempo,
ainda pequeno e sagaz, inventava formas de assaltar a estante da casa dos meus
avós maternos. Vi-a imponente, carregada de enfeites. Os livros tinham lugar de
honra, nas prateleiras cimeiras. Depois de várias e vãs tentativas, o sofá de
orelhas pareceu-me a escada necessária. Queria ler e, mais do que isso, queria
conhecer outros e diferentes enredos, outras palavras e autores. Por sabê-los
longe da minha idade, larguei na procura de lá chegar. Tinham um sem fim de
prosa e poesia. Li novelas de autores nacionais e internacionais. Dicionários
de filosofia e botânica. Um livro bem discreto com bonita poesia erótica, cujo
nome da autora ainda hoje não consigo recordar. Certamente, li fora de tempo,
antes de ter o discernimento necessário. Hoje corro sei lá para onde, deixando
ficar partes fundamentais da engrenagem. Falta-me a agudeza de espírito e a
finura do corpo para voltar à fonte do raciocínio.
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